03 fevereiro 2012

Ligação de Patricia faz R10 decretar saída de Luxa : ‘Já era, já foi’

Canção no ônibus, Ronaldinho na praia e choro presidencial: os bastidores da demissão de Vanderlei Luxemburgo no Flamengo

Saída do Engenhão no início da madrugada de quinta-feira. Ronaldinho, sem cerimônia, passa por um funcionário e decreta o fim da era Vanderlei Luxemburgo no Flamengo.

- Já era, já foi. Foi bater de frente com a gente e caiu - disse o camisa 10.

O capitão rubro-negro sabia antes da vitória por 2 a 0 sobre Real Potosí que a guerra fria com o treinador terminaria após a partida. E recebeu sinais sonoros e claros de que venceria. Enquanto estava concentrado no hotel Windsor, ele atendeu a três ligações de Patricia Amorim durante a tarde. Em todas, a presidente ratificou que o jogador poderia ficar tranquilo porque Luxa sairia e Joel Santana o substituiria. R10 também deu um sinal, só que com música. Ao deixar a concentração, carregava sua inseparável caixa de som. No ônibus, além de samba e funk, seus ritmos preferidos, ouviu-se uma canção sertaneja. O tema: despedida.

Patricia Amorim concede entrevista. Ela chorou ao falar com Luxa (Foto: Jorge William/Globo)
Mais cedo, a presidente foi à concentração buscar ingressos para a partida. Não encontrou Ronaldinho, mas deu o mesmo recado a outro líder do grupo.

- Não posso afirmar que todos os jogadores sabiam que o Luxemburgo seria demitido após o jogo, mas grande parte recebeu a notícia na concentração e festejou. Os jogadores ficaram empolgados. A tática da diretoria deu certo - disse uma pessoa que estava no hotel do Flamengo.

Na concentração, a informação da troca de treinador estava disseminada. O próprio Vanderlei Luxemburgo sabia e chegou a comentar com um assessor:


Com roupa de treino, Luxa
chega à Gávea para ser
demitido (Foto: Janir Junior/
Globoesporte.com)

- Acho que vão me tirar. Mas ela vai ter que ter aquilo roxo... E ela não tem.
No trajeto entre o hotel e o Engenhão, a presidente foi informada por telefone que a informação fora publicada no GLOBOESPORTE.COM. E temeu que a emenda complicasse o soneto. A solução emergencial foi desmentir a demissão - mesmo sabendo que a situação do treinador era insustentável. Em entrevista à Rádio Tupi, a dirigente foi enfática:

- Quero desmentir oficialmente essa informação. Nosso técnico é o Vanderlei Luxembrugo. É ano eleitoral no Flamengo e querem desestabilizar a gente antes de um jogo decisivo - disse.
Após o jogo, ainda no estádio, eufórica pela vitória, Patricia celebrava:
- Tentaram me derrubar, mas não conseguiram. Mengo, Mengo, Mengo!
A ênfase de Patricia garantindo a permanência de Luxemburgo soou exagerada para outros membros da diretoria - que já sabiam do acerto com Joel Santana. Luxa contra-atacou de modo sutil: deu uma entrevista política - sem se comprometer nem criticar ninguém, deixando o ônus da demissão para o Flamengo. O objetivo do treinador era esperar a demissão e embolsar a multa rescisória de R$ 4 milhões. Os dirigentes foram dormir aliviados com a vitória - e a classificação para a fase de grupos da Libertadores - mas com um grande pepino a descascar. Como demitir o treinador depois da entrevista de Patricia?
Depois que saiu do Engenhão, Luxemburgo jantou com integrantes da comissão técnica até 6h no restaurante Fratelli, na Barra da Tijuca. Ele avisou que seguiria o planejamento normal de trabalho, mas sabia que a demissão viria.
- Em 50 anos de futebol nunca vi isso. Sei que tudo o que publicaram é verdade, mas não vou fazer nada. Vou esperar eles se posicionarem - confidenciou.
Os jogadores acordaram despreocupados. Ronaldinho foi à praia na Barra da Tijuca, onde foi observado por repórteres do EGO se divertindo ao lado de uma morena. Comentou brincando que "só iria treinar quando o Luxemburgo fosse demitido". O pepino estava nas mãos de Patricia e de seus principais auxiliares: o vice de finanças, Michel Levy; o vice-geral, Hélio Ferraz, e o até então diretor de futebol, Luiz Augusto Veloso. Numa reunião na casa de Ferraz, em Ipanema, Zona Sul do Rio, a sina de Luxa foi confirmada. O Flamengo arcaria com a multa do treinador e o futebol seria inteiramente reformulado, como havia sido planejado.
À tarde, Luxemburgo seguiu para o Ninho do Urubu, onde havia treino marcado para 16h30m. Chegou às 15h55m no CT rubro-negro. Às 16h20m recebeu um telefonema, entrou no carro e rumou na direção da Gávea ainda com uniforme de treino. Ao chegar na sede do clube na Zona Sul do Rio, o treinador foi recebido pela presidente, com quem ficou a sós por alguns minutos. Na conversa, Patricia agradeceu a Luxa... e se emocionou, chorando.

“Em 50 anos de futebol nunca vi isso. Sei que tudo o que publicaram é verdade, mas não vou fazer nada. Vou esperar eles se posicionarem", Vanderlei Luxemburg

A seguir, entraram Michel Levy e Hélio Ferraz. Levy disse:

- Vanderlei, é preciso entender que o Flamengo é grande. Tem várias correntes.
O treinador respondeu:

- Um clube grande tem que ser comandado por gente grande, que tome decisões grandes.
A seguir, ele se disse desapontado e deixou a sala. Uniformizado, deixou a sede do clube pela última vez como técnico em 2012. Entre os dirigentes que ficaram se ouviu uma frase:
- Enfim, saiu o empresário.

O enredo da demissão
Em rota de colisão com Ronaldinho, o treinador perdeu a queda de braço. A relação era amistosa até metade do ano passado. Porém, os excessos noturnos do astro incomodaram o treinador. Ele fez queixas seguidas à presidente, mas não obteve respaldo. A situação piorou e ficou insustentável no início de 2012.
Logo nos primeiros dois treinos do ano, R10 alegou insônia e ficou dormindo no vestiário. Vanderlei mandou e-mails para Patricia e relatou a situação. Pouco depois, em entrevista ao GLOBOESPORTE.COM, a mandatária disse que esses problemas teriam de ser resolvidos no departamento de futebol. Em Londrina, Ronaldinho levou uma mulher para a concentração. As indisciplinas deixaram o treinador irado. Na outra ponta, o irmão e agente do capitão rubro-negro, Assis, dizia ter recebido sinais de que Luxemburgo cairia após os confrontos contra o Potosí

Foto entre Luxa e R10 foi
ideia de Isaías e não agradou
Patricia (Foto: Alexandre
Vidal/Fla Imagem)
O problema com Ronaldinho não foi o único. A relação com o vice de finanças Michel Levy também foi problemática. Os dois sempre discordaram quando o assunto era reforços. Luxa pediu, por exemplo, André, Wesley e Bolívar. Levy preferiu Kleber, Vagner Love e Marcos González. Ambos trocaram indiretas publicamente em diversas ocasiões O último a se desentender com Luxemburgo foi o diretor de futebol, Luiz Augusto Veloso. A forma pouco atuante dele no cargo iniciou o desgaste. Ao se unir a Patricia e Ronaldinho, o dirigente ganhou a antipatia de Luxa.
A saída de Isaías Tinoco chega a ser surpreendente. O dirigente estava no cargo desde 2005 e resistiu a diversas crises e mudanças profundas no departamento. No entanto, a forte aliança com Luxemburgo o desgastou com a diretoria. Para os dirigentes, ele foi o autor intelectual da foto posada de Ronaldinho e Vanderlei na Bolívia - com a ideia de esvaziar a crise entre ambos. Em vez de fazer isso, acabou irritando a presidente e decretando sua própria demissão. (Globo Esporte)

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